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lunes, 19 de agosto de 2013

"Muito leitinho" para eles?

Quando cheguei ao Brasil e comecei participar de listas de maternagem consciente me chamou a atenção que, quando tinha nascido um bebê da lista, as outras mães lhes desejavam "muito leitinho". No começo, confeso, achei fofo. Uma forma carinhosa de desejar suceso na amamentação. Mas tinha alguma coisa que destoava dentro de mim.

Quando alguém deseja sorte com alguma coisa para alguém (com a nossa melhor intenção, sempre, obvio), estamos transmitindo para essa pessoa que:

-Existem muitas chances de -inclusive que o normal seria- não alcançar o objetivo.

-Não depende dela conseguí-lo.

-Se o consegue, pode se considerar afortunada pois "foi lhe desejada e otorgada a sorte".

Em definitiva, se desejamos para uma mãe e o seu recem nascido bebê que tenham "muito leitinho", não estamos contribuindo em absoluto ao empoderamento dessa mulher. Pois não parecemos contemplar nem confiar em que, naturalmente, eles vão ter, de fato, tanto leitinho quanto esse bebê precisar. Não estamos lhes transmitindo a certeza de que esse seu corpo de mulher está perfeitamente pronto (salvo casos raros) e preparado para nutrir o bebê dela com a quantidade de leite exata que ele fôr precisar (nem mais nem menos, pois se fôr demais, também, podemos acabar com uma mastite!).

Podem surgir difficuldades? Com certeza. Para isso existem cada vez mais profissionais formados e informados que podem lhes ajudar, assim como grupos de apoio.

Por outro lado, quantidade de leite (que é o que com essa frase desejamos e, curiosamente, também a questão mais demandada nos atendimentos de amamentação: "Tenho suficiente leite?") se determina práticamente por um único fator: AMAMENTAR EM LIVRE DEMANDA. Isto significa dar de mamar ao nosso bebê tantas vezes quanto ele quiser, durante tanto tempo (pouco ou muito!) quanto ele quiser. Quanto ele quiser. Quando ele quiser. Quanto ele quiser.

Ma se já começamos lhes desejando "muito leitinho" como se isso fosse uma questão de sorte, pode crer que a confiança dessa mulher talvez se resinta mais um pouco ou, como mínimo, não vai se ver fortalecida em absoluto.

Podemos lhes desejar muito sossego para eles dois poderem se vincular em paz. Podemos, também, lhes desejar ajuda al redor para ela não se preocupar com outras questões além do bebê. Podemos lhes desejar um pediatra bem informado e um entorno livre de opinólogos, assim como o apoio de um grupo de mães que também amamentem e de profissionais bem informados em caso de difficuldade. Podemos lhes desejar, em definitiva, que todas essas questões externas que podem determinar que o seu aleitamento seja melhor sucedido estejam ao seu favor para assim essa mãe conseguir confiar nela mesma e sua capacidade de nutrir o filho, confiando também na demanda do seu bebê, seja ela qual fôr.

Vamos cuidar a linguajem e a que transmitimos subconscientemente com ela?

Elena de Regoyos para MamaÉ
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